É
hora de acabar com a esdrúxula ideia da existência real de Lúcifer, Diabo, Demônio,
capeta e mil outros denominativos, inclusive de anjos em geral. Vasculhe-se a
fantástica miologia cristã, herdada do judaísmo, descrita no Antigo Testamento,
referendada pelo Novo Testamento. Não se
encontra, em momento algum, que o Senhor, Criador de todas as coisas, durante
sete dias, teria criado os anjos. Nos
dois primeiros capítulos de Gênesis, com descrição tão minuciosa dos sete dias
da criação, nem vestígio de Deus criando puros espíritos para, futuramente, ajudá-lo
a governar o Universo. Anjos bons e maus vão aparecendo, durante a narrativa
bíblica, sem dar sinais de sua procedência, a não ser enviados por Deus. O
primeiro a aparecer, encarnado em inocente ofídio, lá no Eden, para seduzir o
casal encarregado de cuidar do Jardim, cujo nome nem sequer é mencionado,
apenas como serpente, injustamente amaldiçoada, às vezes até abençoada, no decorrer
da mitologia. Para justificar inúmeras aparições no contexto da História Bíblica,
o Cristianismo inventou a mirabolante história da luta de um tal de Lúcifer
contra o Criador pretendendo assentar-se no trono do Altíssimo. A espada de um
certo Miguel Arcanjo, lugar tenente da
Divindade, dividiu o reino em duas metades, anjos maus e anjos bons.
Anjos maus, para azucrinar a humanidade sobre a Terra, e anjos bons, como mensageiros
da Divindade, levados por supérfluas asas.
Se não há como explicar a origem de tais seres,
puros espíritos,
como criaturas reais, há de se procurar outros caminhos. Numa concepção
mais afeita à racionalidade, palatável a um pensamento menos mitológico, porque
não traduzir tais seres como bons ou maus pensamentos, a induzir os seres
humanos a praticar boas ou mas ações? Nesse sentido, Jesus, ao pregar o Evangelho,
semeou centenas de anjos bons para orientar os crentes para o bem. Maus
pensamentos, ditos sete demônios, atormentavam Maria Madalena, induzindo-a a
comportamentos extravagantes. Ninguém consegue explicar a legião de demônios
encarnados na manada de porcos que afundou no mar. O evangelho não conta mas é fácil
imaginar Jesus sendo processado pelo dono dos porcos, exigindo reparação pelos prejuízos.
Um exemplo, tirado do Novo Testamento, mais liberto
da mitologia, para indicar quão fátua é
a ideia da existência de seres reais, incarnando o bem e o mal, apelidados
anjos ou demônios. É ler o evangelho de Mateus (Cap. 1 e 2). Nas três vezes em
que José, o esposo de Maria Mãe de Jesus, é orientado de como se portar nas
determinadas circunstâncias: no momento em que descobre que Maria estava grávida, sem seu concurso;
quando advertido para fugir para o Egito diante da ameaça de morte do Menino
Jesus por Herodes e; a ser-lhe ordenado que voltasse para Nazaré, depois da
morte de Herodes, nas três vezes, o evangelista diz - “... eis que lhe apareceu, em sonho (grifo meu), um anjo...”. Sonho não é realidade, e fantasia, que, no
máximo pode ter algum significado real, segundo explica o pai da Psicanálise
Freud, quando bem interpretado. Bons pensamentos guiaram José para suas boas
e providenciais decisões, salvando a
sagrada família. Passava o dia pensativo, matutando os problemas comentados na
comunidade, e à noite sonhava, acordando com a solução, indicada pelo sonho.
Já imaginaram os bilhões e bilhões de Anjos da Guarda
atribuídos a cada criança que nasce? Quando a pessoa morre, seu anjo volta para
descomunal depósito esperando nova designação?
Bem fariam os exegetas se dispensassem tantas explicações
ocupando o tempo com assuntos mais importantes.
Infelizmente, volta-se ao tema diante do fato de que
nenhum pregador sobe ao púlpito com coragem para abrir o jogo, diante de plateias
que não têm acesso a literatura mais afeita à realidade.
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