quarta-feira, 9 de setembro de 2020

 

Perdão

Elizio Nilo Caliman – Brasília

Em tempos idos, publique no Boletim comentário sobre “Perdão” tão insistentemente invocado no Pai Nosso, ensinado por Jesus, com base no livro do filósofo Huberto Rohden – Metafísica do Cristianismo, A alma de Jesus revelada no Pai Nosso, ed. Martin Claret, 2013. Com o retorno do tema no último Boletim, sinto-me provocado a retornar ao assunto.

Minhas argumentações baseiam-se em afirmações do filósofo e educador.  Ao fazer a tradução dos evangelhos, foi aos originais, o Grego e o Aramaico, fazendo descobertas de como as traduções de que dispomos sofreram distorções, na medida em que foram sendo reproduzidas e retransmitidas, através dos tempos.

Com relação ao termo perdão, afirma não ter encontrado a palavra nos originais. No Grego encontrou a palavra “aphíemi, que quer dizer desligar, soltar, libertar; a tradução latina é dimitere, que significa demitir, soltar”. Foi este o termo, corretamente, utilizado por São Jeronimo na Vulgata: “Demite nobis debita nostra, sicut et nos dimitimos debitoribus nostri”(grifo meu).

Dessa constatação, o autor infere uma nova postura com relação ao pedir perdão, nos seguintes termos:

“O sentido profundo é este: o ofendido deve desligar-se do ofensor, ignorá-lo, não tomar nota; não deve sentir-se ofendido. Somente é ofendível o homem-ego, ao passo que o homem-Eu é inofendível. O ego ofendível é como água, que é alérgica às impurezas do ambiente e é por ele contaminada”. O Eu, porém, é como a luz (“vós sois a luz do mundo”) (Pag. 73). Mais adiante:

 “Assim, o Eu, que é luz, é inofendível, ao passo que o ego, que ainda é como agua, é ofendível. Quanto mais ofendível alguém é, tanto mais ele é ego - e quanto mais inofendível  alguém é, tanto mais ele  é Eu. O ego sofre de ofendismo crônico e, não raro, de ofendite aguda. ... Melhor do que vingar ou perdoar é desligar-se, ultrapassar a horizontal do ego ofendível e subir para a vertical do Eu inofendível”.  (pag. 74).

O autor cita Gandhi que, ao ser perguntado se teria perdoado toadas as injustiças a seu inimigos, respondeu que não, pois, nunca ninguém o ofendera, demonstrando que já estava na esfera vertical do Eu.

Dessas argumentações, cabe-nos concluir que exigir pedido de perdão é rebaixar-se ao nível do ofensor e pretender humilha-lo. Não pedir perdão não significa, porém, não se arrepender e não reparar o mal, tanto moral como físico ou financeiro, na medida do possível.

Cabe aqui a anedota do confessor que, perante uma devota que andava difamando as pessoas, ordenou-lhe que subisse ao alto da torre e depenasse uma galinha, lançando as penas ao vento. De volta para receber a absolvição, o sacerdote, como penitência, mandou-a recolher as penas.

A se levar em conta a descoberta de Huberto Rohden, uma conclusão se impõe. Com relação a Deus, a Luz das luzes, é plenamente inofendível. Pairando, em sua perfeição acima, ou dentro, de todos os seres do universo, não se humilha exigindo pedido de perdão.

 Às religiões, cabe instruir seus seguidores para não perderem seus tempo e dignidade, arrastando-se, humilhantemente, perante a cruz, chorando e pedindo perdão dos pecados, a cada Sexta-Feira Santa. Que o simbólico “me desculpe”, seja cultivado para demonstrar o arrependimento e o propósito de ressarcir os danos causados, fugindo a uma simples formalidade.

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